ALIENÍGENAS HUMANOS E EDUCAÇÃO AMBIENTAL


Quando você se olha nos espelho, a primeira coisa lhe vem a mente é: “sou um ser animado por uma força misteriosa, que alguns chamam de espírito. Além disso sou composto pelas mesmas partículas que existem dispersas sob o chão em que eu piso e de partículas acima da abóbada celeste”.

Acertei? Aposto que não!

Por trás dos seus olhos pode haver outras imagens predefinidas na mente por parâmetros externos, prontos para impulsionar o auto julgamento da sua imagem refletida no espelho. Como se fossem aqueles “filtros” dos programas de tratamento de imagem que qualquer celular hoje possui. Porém estes “filtros” estão atrás dos seus olhos e podem ter sido instalados sem que você percebesse.

Estes filtros são os parâmetros pré-existentes de outros corpos humanos idealizados como padrões referência, em termos estéticos ou atléticos, para julgarem a adequação ou não da sua própria imagem. Se você não observa estes “filtros” mentais pré-existentes, quando se olhar do espelho, automatismos do seu pensamento sobre o seu corpo surgirão rapidamente: “estou gordo”, “estou esbelto”, “estou magro”, “tenho novas rugas”, “meu cabelo está bagunçado”, “meu cabelo está alinhado”, “estou calvo em demasia”.

E isso faz você perder a oportunidade de olhar para si, expandindo o seu autoconhecimento. Você não se atreve a formular outras hipóteses sobre você no mundo, que ultrapassem uma definição simples: apenas um corpo, que pode estar próximo ou distante de certos padrões de outros corpos humanos idealizados.

A visão que tem de si é de pequeno alcance, se for assim. É uma visão comparativa e pouco aprofundada sobre si mesmo e sobre sua conexão com a vastidão do mundo e do universo existentes.

Somos poeira de estrelas”, sentenciou o cosmologista Carl Sagan (1934-1996), admirado que estava com a enorme quantidade de matéria, fonte de vida, espalhada pelo universo e presente em nosso planeta.

Somos compostos de minerais, espraiados pelos mananciais de água, formadores das terras, dos morros e montanhas do nosso Planeta.

Somos seres semoventes, não absorvemos a energia capaz de suprir a sobrevivência diretamente da estrela sol, como as irmãs plantas.

E como nós, humanos, vamos nos movimentando por este Planeta? Nos autorreferenciando? Autorreferenciando nossos corpos a partir de outros corpos humanos, quando nos olhamos no espelho, num circuito fechado? Ou, ao contrário, temos conseguido resgatar a memória longa de pertencimento ao todo integrado: a vida no Planeta Terra, o próprio Planeta Terra, os astros, estrelas e o Universo?

Não há como falar de educação ambiental, se não nos atentarmos para a necessidade do retorno ao autoconhecimento dos seres humanos como seres absolutamente integrados e semelhantes a toda natureza que se interconecta no Planeta Terra.

No mundo contemporâneo, houve a desnaturalização da percepção dos que os seres humanos são em realidade. A consequência é que muitos seres humanos tem vivido como se fossem “alienígenas humanos”, na medida em que perderam a capacidade de identificação e reconhecimento da irmandade evidente dos humanos com tudo o que se conhece aqui no Planeta, que chamamos de “natureza”.

As crianças experimentam projetos de “educação ambiental”, sendo ensinado a elas como devem ser responsáveis com o uso da água em seus banhos diários, ou por que não devem deixar de separar os materiais para a coleta seletiva, como se fosse tudo não passasse de um tributo penoso que devem suportar, a fim de salvar as futuras gerações.

Adultos adotam o fetiche do standart do “consumo consciente” para melhor posicionar a imagem profissional.

O que se está a fazer? Nada mais que o reforço imagético de que, de um lado, estariam os humanos e, de outro, a “excêntrica” (posto que de pouca familiaridade) natureza.

Em uma lúcida entrevista fornecida à Deutsche Welle (DW), Ailton Krenak, diz categoricamente: “Humanidade vive divórcio da vida na Terra”.

Ailton Krenak é um líder indígena brasileiro, reconhecido nacional e internacionalmente, autor de “Ideias para Adiar o Fim do Mundo”. Ele defende que “sujar a mão de terra” é uma das vias para reconectar o “clube da humanidade” com o planeta.

Ou seja, a proposta de Ailton Krenak está no sentido de ajustar a visão, os sentimentos, os pensamentos e o querer em relação ao planeta. Parar de vê-lo apenas como “fonte de recursos naturais”. O “querer” o planeta passa a ser querer viver nesta casa, com alegria e satisfação, regozijando de todas as dádivas que existem dentro dos copos humanos e no entorno destes corpos.

Esta mudança de sentimento e desejos em relação ao planeta é que impulsiona a mudança do pensamento sobre o Planeta.

Na proposta de “por a mão na terra”, singelas e constantes vivências de cultivo de plantas, de volver a terra, de criar intimidade com os ritmos e expressões da natureza seriam capazes de ir despertando esses novos sentimentos e quereres humanos em relação à irmandade vegetal, animal e mineral que lhes avizinham.

Crianças não devem sentir a relação com a natureza como algo penoso, mas sim vivenciar o que já se inclinam a realizar com bastante espontaneidade: a abertura para o convívio, para a admiração e regozijo com as variadas formas, cheiros e cores destas irmandades. Dessa forma, projetos educacionais ambientais podem se desenvolver com muito sucesso se permitirem esta conexão fluida das crianças com o que nomeamos de “meio ambiente”.

Aos adultos também não é tão diferente assim: a educação ambiental pode se efetivar por atividades que propiciem familiarizarem-se com a matéria que carrega os mesmos compostos que estruturam os corpos humanos: a terra. O familiarizar-se pressupõe, antes mesmo do pensamento, a vivência e a permanência da vivência nas atividades de cuidados com a terra e os frutos que dela advém. Frutos que tem nos alimentado a milhares de anos.

A educação ambiental é essencial e foi um dos pontos de atenção da “Agenda 21”.

No ano de 1992, na cidade do Rio de Janeiro, foi realizado ela ONU a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD), conhecida como “Rio 92”.179 países participantes da Rio 92 realizaram um acordo e assinaram a Agenda 21 Global, um documento que contém um programa de ação visando realizar, no planeta, o “desenvolvimento sustentável”. “Agenda 21” foi assim nomeado pois remete à intenção pelas mudanças nos padrões de desenvolvimento do século XXI.

A “Agenda 21” dedica um capítulo inteiro sobre educação ambiental: “Capítulo 36: Promoção do Ensino, da Conscientização e do Treinamento” e destaca que a educação é “fator crítico” para promover o desenvolvimento sustentável e também para desenvolver capacidades das pessoas de lhe darem com as questões relacionadas ao desenvolvimento e meio ambiente.

É imperioso que os projetos de educação ambiental rompam, de vez, a sensação humana de ser um alienígena no ambiente do Planeta Terra, ou seja, romper com o sentimento de que a “natureza” seria algo que está sempre fora e não dentro, constituindo cada ínfima célula das milhões que possuem os corpos humanos.

Apenas assim, mudança de hábitos, inseridas em planos de ações concretas de preservação e recuperação do meio ambiente, gerarão mais permanência e sentido nas rotinas diárias das pessoas.


#educacao #ensino #valores #autoconhecimento #autodesenvolvimento #popularizacaodacientica #etica #direito #cidadania #sociologia #pedagogia #teoriasdodesenvolvimento #desenvolvimentohumano #psicopedagogia #psicologia #inteligencia #inteligencias  #acessoaodireito #escola #palomagoulart.advogada



Paloma Elaine Santos Goulart

Escritora - Professora - Advogada

Doutora e Mestre em Sociologia / Especialista e Bacharela em Direito



Siga as Redes para mais Conteúdos!








Referências

MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Agenda 21. Disponível em <https://antigo.mma.gov.br/responsabilidade-socioambiental/agenda-21/agenda-21-global.html>. Acesso em 30.05.2022.

KRENAK, Ailton : Humanidade vive divórcio da vida na Terra. Por João Pedro Soares. Entrevista de Ailton Krenak. 29/03/202129 de março de 2021. Disponivel em <https://www.dw.com/pt-br/humanidade-vive-div%C3%B3rcio-da-vida-na-terra-diz-ailton-krenak/a-57015686>, Acesso em 30.05.2022.


Imagens

Imagem livre de Daniela Realpe por Pixabay . Disponível em <https://pixabay.com/pt/illustrations/nave-espacial-spacescraft-4828098/>. Acesso em 30/05/2022.


Comentários